quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Texto sobre o processo eleitoral por Denilson Melo

A mensagem abaixo está circulando pelos correios eletrônicos, certamente produto de um eleitor do PSDB. Acho oportuno posicionar-me, não pela qualidade do conteúdo da mensagem, mas por reconhecer que boatos e mensagens de terror fazem efeito e, junto com outros aspectos, foram responsáveis pela vitória de Dilma não ter sido efetiva, já no primeiro turno.

Não vou calcular votos, não tenho dúvida quanto a termos uma vitória consagradora no segundo turno caso cada eleitor consciente de Dilma esclarecer um indeciso ou votante opositor que está votando no PSDB por boatos como esse. Sem buscar ser exaustivo nos argumentos, faço algumas reflexões quanto às críticas, ou melhor, boatos levantados.

Quem preparou a mensagem, direcionando aos patrões e proprietários, cometeu um erro, acredita que todos pensam como ele. Eu me enquadro tanto na classe de empregador (de serviços domésticos) quanto na de proprietário (do imóvel de residência e de um automóvel), mas discordo integralmente das críticas. Estou certo que mesmo com a eleição de Dilma continuarei proprietário, mas espero tornar-me incapaz economicamente de empregar alguém para as atividades domésticas, não pela redução da renda da minha família, mas pelo aumento do salário mínimo e faixas salariais próximas a este, reduzindo as disparidades de renda no Brasil (espero em breve não ser mais um empregador de doméstica, mas no máximo contratar dias ou horas de profissional para fazer as atividades que eu não disponha de tempo ou não saiba fazer bem). Apesar de ainda estarmos distante disso, estamos no caminho, temos visto um significativo crescimento do salário mínimo nos últimos 8 anos, já aproxima-se de 300 dólares (em 1994 eram pouco mais de U$ 70). Quem acha que é decorrência apenas da desvalorização do dólar, vá um dia num Atacadão Extra ou supermercado da mesma linha para verificar qualitativamente o poder de compra das classes de menor renda. Quem preferir números, como o autor das críticas ao PT, seguem alguns relacionados ao tema: crescimento real do salário (reajuste menos IPCA) 72% de 2002 a 2010, contra 46% de 1994 a 2002. Medido de outra forma, comprava 120 litros de gasolina em jul/94 (R$ 0,54/l), 125 em meados de 2002 (R$ 1,6/l) e 192 em set 2010 (R$ 2,65/l). Acho que o autor dos boatos se ressente por não estar comprando mais combustível para seu veículo SUV ao invés de pagar tanto as domésticas e auxiliares “influenciáveis”. Ou quer manter um grande número de “influenciáveis” que não tenha outra alternativa de sobrevivência que não seja trabalhar por qualquer salário.

Tratando apenas um pouco mais de economia, os especialistas da Globo, Veja, CBN e Folha (apenas para exemplificar) podem dizer que Lula tem sorte pelo desempenho econômico, que é resultado da valorização de commodities ou da estabilidade do real e medidas “saneadoras” do governo anterior, como gostam de repetir. Recomendo que leiam (ou releiam) J. Kaynes (autor que estava esquecido até o primor de economia liberal que materializou-se em 2008), particularmente sobre o Multiplicador (crescimento de rendas menores aumenta mais o consumo e aquece economia) e Ações anticíclicas (atuação estatal para combater reduções ou desacelerações indesejadas do PIB). A estabilidade teve contribuição, reconheço que sim, mas não foi determinante, basta ver a fragilidade econômica que vivemos de 1994 a 2002, sempre beirando a crise nos menores movimentos dos mercados externos. Só para esclarecer um pouco mais, o Plano Real lastreou-se em fixação do câmbio, desindexação dos salários e corte das despesas públicas (não apenas gastos correntes como também investimentos). Em 1998 quando estava prestes a ir a pique (fazendo água pelo câmbio), tal qual o plano cruzado em 1986 (fazendo água pela fixação dos preços e incapacidade de atender às demandas, sem falar na ação deliberada de postergar/ estocar produção, contribuição dos empresários ao naufrágio) foram proteladas ações de correção (no câmbio em 1998) para ganhar a eleição, ou melhor, reeleição (este ponto nos conecta com outro assunto levantado, tornar o Brasil satélite da Venezuela ou de Cuba).Tenho muito mais para falar de economia: fim da dívida em moeda estrangeira, redução da relação dívida/PIB, redução de juros, crédito ao pequeno empreendedor, mas como ainda há muito por ser feito, é melhor deixa algo para daqui a 4 anos.

Não entendi a intenção do crítico ao nos tratar como satélite de Venezuela e Cuba, aprendi nas lições de geografia que o satélite gira entorno de um corpo celeste maior, não o contrário. Não vejo o Brasil gravitando entorno de Cuba ou da Venezuela, vejo o Brasil tentando fugir do campo gravitacional americano e buscando trajetória própria, isso é uma questão geopolítica que não vejo ser discutida na Globo, Veja... (vocês já sabem quem). Se por outro lado o autor não deseja para o Brasil modelos totalitários, também concordo (quem parece discordar são aqueles meios de comunicação que chegaram a chamar o regime implantado em 1964 de "dita mole"). Se o governo de Lula fosse totalitário não haveria espaço para os saudosos dos golpes, não é liberdade de expressão ele entender que a maior parte da imprensa “livre” faz campanha partidária sem deixar claro isso. A questão é que o conceito de liberdade desses veículos de comunicação é a do liberalismo do século 17 que aceitava a escravidão (o que também já foi legitimado por muitas religiões), ou talvez o neoliberalismo, que acreditam numa suposta meritocracia intelectual e na ação desses “libertando” os não letrados (para esses recomendo que leiam Darcy Ribeiro e Paulo Freire). Talvez a questão não seja liberdade, uma vez que ela só falta para as domésticas, auxiliares ou desprovidos “influenciáveis”, mas a propriedade. Caso seja isso, sou obrigado a reconhecer que durante muito tempo considerei a possibilidade de eliminarmos a propriedade privada como melhor alternativa para sociedade, apesar de não mais considerar isso, reconheço a opinião de quem não é proprietário (maior parcela da população) e que sente no corpo e na mente a exclusão social e que deseja mudanças imediatas, tais quais propõe o candidato Plínio e demais partidos mais à esquerda. Não descarto a abolição da propriedade privada, mas vejo como alternativa mais viável a redução da disparidade social (a classe média detectada por M. Weber e ainda incipiente quando dos estudos de K. Marx), e isso tem ocorrido no governo Lula, ainda que lentamente. Poderíamos acelerar esse processo? Acredito que sim, isso ocorre na China, mas não sem pagar o preço do governo pela força. É interessante que os críticos da política e falta de liberdade da China (Globo, etc...) elogiem os efeitos econômicos do subemprego, das decisões centralizadas, etc. Não quero para o Brasil o que ocorre hoje na China, invejo o norte da Europa (exceto pelo clima) que tem estados grandes, porém, voltados para sociedade, não nos vejo caminhando para uma sociedade do norte da Europa no governo do PSDB, mas para uma sociedade mexicana ou centro americana, nada contra nossos irmãos latinos, mas eles precisam, como nós, fugir da gravitação econômica e política americana, o que diverge nossos ilustres comentaristas políticos da Globo, e demais veículos da imprensa “livre”, além dos partidários do PSDB. Faço apenas uma ressalva, não demonizo a sociedade americana, acho que eles têm muitos acertos, as políticas externas e relações econômicas com os outros povos não estão entre esses pontos positivos (sem falar em desigualdades internas deles).

Quanto a dizer que o governo é da quadrilha do pt, avaliemos. O PT, como a sociedade, é formado por uma diversidade de pessoas. Nas decisões de um, de dois, de um pequeno grupo ou de grupos maiores há muito mais que boas intenções e interesses coletivos. Por outro lado, temos exemplos de práticas éticas extirpadoras de vícios e inimigos em Cuba (que antes de Fidel era um pouco mais que um produtor de açúcar e prostíbulo para os americanos, sendo inicialmente necessária tal medida de força), em Israel, no Irã, na ex-URSS, na China, no Camboja, pela KKK nos EUA, pelos EUA no Afeganistão e Iraque, pela inquisição na Idade Média, recentemente na Somália, na Libéria (entre outros países africanos), na França (expulsão de ciganos), em Costa do Marfim, no Pará em Eldorado dos Carajás, na Zona da Mata pernambucana, etc. É isso que queremos? A prevalência de uma posição a custa de vidas dos opositores? Não vejo essa alternativa como solução. Também não me conformo com possível compra de votos no Congresso ou troca de cargos por apoio (apesar dos elementos que compõem essas acusações são levantadas por pessoas e organizações nada isentos, o que ao menos torna difícil uma melhor compreensão dos fatos, deixando-nos numa esfera de conjecturas). No passado acreditei em mudanças rápidas e não violentas, hoje acredito que a única forma dessa mudança rápida e eficaz é a força, que por sua vez fica fora de controle, como bem observou Montesquieu: o único limitante do poder é o próprio poder. Não estou propondo a força como alternativa para nossos problemas políticos, acredito que hoje pagamos o preço de uma mudança não violenta: a tolerância e manutenção de práticas inadequadas na gestão pública. Temos que ser mais seletivo nos votos dos candidatos e no controle da atuação do Legislativo, não apenas no Executivo.

Até quando pagaremos esse preço? Talvez os eleitores do PSDB tenham a resposta: quanto custou a reeleição de FHC? Acho o mandato de 4 anos pequeno, mas um presidente esforçar-se para aprovar mudanças que permitam sua reeleição não seria casuístico, qualquer semelhança com a Venezuela e Colômbia (que a imprensa “livre” brasileira não critica pelo alinhamento com seu pensamento, criticando apenas a primeira) foi mera coincidência. Mais uma mancha para um sociólogo que disse para esquecermos o que ele escreveu. De quanto foram as comissões para formação dos grupos de privatização? Quem criticou o PT não questiona isso por ser um assíduo leitor da Veja e telespectador da Globo, isso não é questionado por essa imprensa "livre", sem falar um sem número de escândalos não investigados graças a existência de “engavetador geral da república” e de uma maioria (não se sabe a que preço) no Congresso, tudo isso sob o silêncio, ou reportagens sem relevância nem persistência da mídia “livre”. Acho que um bom indicador de estarmos caminhando na direção de menos abusos com a coisa pública, foi dado por Lula ao não ter tentando uma nova reeleição, que não seria barrada, desde que fosse pago um preço alto. No mais só dá para fazer conjecturas sobre essas questões. Não mais pauto a escolha do meu voto puramente por minha ética (como acreditei fazer no passado), pela dificuldade de julgar os atos e intenções num contexto de interesses específicos de cada uma das partes. Pauto também pelos acertos e erros manifestados externamente, o que sem dúvida (para maior parcela da sociedade) tem sido maiores no governo de Lula. Isso não se trata de um abandono de questões de ética e moralidade, sou favorável aos requisitos do ficha limpa, mas também de ações individuais que costuma faltar entre os empregadores e proprietários: não compra de recibo para fraudar o IR (prática não pouco freqüente entre os influenciadores), registro correto de seus empregados, entre outros.

Há muitas outras questões a serem discutidas, deixo para outras oportunidades: esclarecimentos quanto ao tamanho do Estado, privatização, carreira pública, educação, saúde, habitação, etc.

Concluo com um chamamento:
Eleitores conscientes do PSDB, lamento, serão minoria, aceitem a necessidade de uma sociedade plural na qual as maiorias não sejam oprimidas. E reconheçam a impossibilidade de construir um Brasil melhor através de um liberalismo hipócrita que só gera a liberdade das enormes desigualdades se manterem. Para os inconscientes, escutem, leiam (com senso crítico, não consumindo tudo que dizem), reflitam, não decidam baseados em boatos.
Eleitores conscientes de Dilma, não é difícil encontrar argumentos para convencer eleitores em dúvida ou opositores inconscientes. Vamos à vitória no segundo turno.


Sds,
Denilson Melo

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